terça-feira, 9 de agosto de 2011

Trechos do livro Loucura Necessária - parte II

“- Autopreservação. Quando você está se afogando, você se agarra a qualquer coisa. Porque é necessário. Porque não tem escolha.
- Mesmo se é loucura? Mesmo se esse esforço para sobreviver fizer com que você perca seu ponto de apoio?
- Mesmo assim.”

“Excesso de tristeza, risos. Excesso de alegria, lágrimas.”

“A solidão cria maus hábitos.”

“- [...] Acho que sou uma pessoa solitária.
- Por escolha?
- Acho que não. Apesar de eu mesma tornar minha solidão pior do que ela é.
- Não há nada de errado com a solidão. Até você encontrar aquela pessoa, a que aceita, a que entende.”

“Parecia tão infantil que me deu vontade de rir. Então explodir em lágrimas. Os soluços eram tão fortes que chegavam a doer, parecia que nunca mas eu iria me sentir bem em meu próprio corpo. Ele me puxou da cadeira para seu colo. Apertei meu rosto em seu pescoço. Queria me enfiar debaixo de sua  pele. Ele beijou o canto de minha boca.
 - Não me deixe – murmurei.”

“A dor endurecia as assim chamadas pequenas rugas de riso.”

”Eu sei como é quando dói tanto que você deseja machucar alguém e... para onde irei agora?”

“- Apesar do que dizem as pessoas, nunca fica mais fácil, não é mesmo?
- Depois de um tempo ocorre uma espécie de amortecimento, um amortecimento pelo qual você tem de passar se algum dia se levantar da cama uma manhã, lavar a roupa e preparar o café sem se desmanchar em lágrimas. Li histórias sobre crianças que caíram dentro de lagos congelados e que, depois de permanecerem submersas, sobreviveram. Eu me perguntava, então, ‘como será que conseguem?’, mas hoje sei, porque meu sofrimento não é muito diferente da sua sobrevivência. Depois que você atinge um certo grau de frio insuportável há um mecanismo de desligamento que entra em ação. O fluxo do sangue fica mais lento. Os órgãos e as paixões arrefecem. Você faz o que precisa fazer e o faz bem.
- Loucura necessária – murmurei.
- Isso mesmo, e depois, de repente, você se refestela numa poltrona confortável para ler e o sol bate na página do livro. Você incha de alegria, sente que nunca viu algo tão belo e é quando lembra: eu vi, eu vi. Então, respondendo à sua pergunta, não. A dor fica mais sutil, mas de fácil não tem nada.”

“Peguei  seu rosto entre as mãos enluvadas e o beijei na testa.
- Por que fez isso?
- Por você estar aqui. Por me entregar o mapa da estrada para o inferno.”

“De todos os pesadelos possíveis, este era o pior: quando se sonha que se está caindo e que, se não acordar, você morrerá. Mas eu já estava acordada.”

“E assim me virar para seu abraço que me esperava, e quando suas mãos se enfiaram por baixo do tecido fino da camisola, murmurei “eu te amo, eu te amo” em sua nuca, como se o amor bastasse, como se o amor fosse uma armadura, um amuleto capaz de nos conduzir da escuridão para a luz.”

“- Você o amava?
- Sim. Não importa o que você pensa, não importa quão frios e insensíveis ele possa lhe ter contado que tenham sido meus sentimentos em relação a ele; sim, eu o amava.”

“... você está escorregando e eu não consigo segurar você, por mais que me esforce, por mais doce que seja meu abraço.”

“... mesmo em sua dor mais petrificante, lá no fundo de sua mais profunda escuridão, meu amor, eu estou aqui, eu estou aqui.”

“Sorri levemente.
- Então, como tem passado? – perguntou.
Fiz um gesto vago com a mão.
- Estaria mentindo – respondi – se dissesse que estou bem, mas as coisas estão um pouco melhores.
- Isso é muito bom. Sabe o que dizem sobre o tempo...
- Cura todas as ferias, eu sei. Mas não sem deixar cicatrizes, pode acreditar.”

“... como em meus momentos mais negros e mais peçonhentos ele estava disponível, tão disponível a ponto de pegar meu pulso e chupar o veneno da ferida, de correr o risco de ficar com o veneno na boca durante uns poucos e perigosos segundos.”

“Corri para o banheiro e lavei o rosto com água fria. Respirava em arquejos frenéticos. Meus olhos umedeceram-se. Olhei-me no espelho, fitei-me e pensei: “Você tem de ser melhor do que isso”.

“O jogo acabou. Sobrarão pessoas feridas suficientes para rivalizar a magnitude de nossa dor, a dor que juramos que ninguém conseguiria ultrapassar.”

                “E se sentimos medo de causar dor? E se, nós mesmo, temos medo de sentir a dor? Aí, então, é chegado o momento de congelar. De colocar no piloto automático. Da Novocaína psíquica. Levantar-escovar-os-nossos-dentes-escovar-os-nossos-cabelos-preparar-o-café-da-manhã-ir-para-o-trabalho-voltar-para-cara-jantar-cair-na-cama. Não pensar no que está acontecendo. Não permitir que o amor ou a angústia se esgueirem para dentro de você. E então, quando explodirmos, estaremos em campo aberto, sem abrigo, sem máscara, os ossos à mostra, a carne dilacerada.
Deve haver uma outra opção, mas qual?
- Não sei – respondi em voz alta.”

“Quero sair dessa vida como saio de um quarto. Quero ser qualquer pessoa, menos eu.”

“Os eufemismos bondosos e as preparações cuidadosas reduziram-se a um engasgo brutal em minha garganta. [...] Até o ar que circulava entre nós parecia sofrer. [...] Esperei o grito da solidão se apoderar de mim.”

“Cada vez que eu sentir desejo, cada vez que minha língua dormente se voltar para a boca aberta de um estranho, cada vez que minhas pernas se abrirem e meus braços envolverem a cintura de um homem, prometo que vou pensar em você. Em seus olhos castanhos cheios de lágrimas, em seu rosto silencioso, contorcido pela raiva.”

“Eu o desejo aqui em fragmentos: suas mãos excitadas, sua voz como dedos afagando e afastando a dor de um machucado.”

“Você estava distante, sem a menor dúvida. Mas ele não ficaria satisfeito. Nem mesmo se você se jogasse a seus pés. Porque você era a mulher errada.”

“Comemos em silêncio, atravessando uma fronteira num ponto onde o fim era apenas o começo.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário